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A Coréia do Sul e as diferentes interpretações sobre seu sucesso econômico

Como a Coreia do Sul cresceu tão rápido economicamente? O que um país precisa para se manter em expansão econômica? Algumas respostas para esses questionamentos são desenvolvidas no artigo de Uallace Moreira Lima (UFBA)  "O debate sobre o processo de desenvolvimento econômico da Coreia do Sul: uma linha alternativa de interpretação", que analisa as três principais correntes teóricas sobre o motivo do “sucesso” coreano, a evolução histórica da Coreia e a condução da política econômica correlacionando a estrutura de propriedade do capital, organização empresarial, centralização do capital e processo de absorção e desenvolvimento tecnológico.



O artigo primeiramente revisa os motivos mais defendidos para explicar a rápida ascensão da Coreia, sendo eles, a escola neoclássica, a corrente heterodoxa endogenista e a corrente do cenário externo favorável.


A escola neoclássica defende que o sucesso se origina dos princípios do mercado, seguindo um modelo de desenvolvimento orientado para fora, chamado export-led enquanto o Estado serve para apoiar o mercado. Os principais autores desse pensamento são o Balassa, Westphal e Kim e o Banco Mundial. Balassa analisa as estratégias de economia sob duas óticas: o modelo de orientação para fora que está associado a uma política de promoção das exportações e o modelo de orientação para dentro que está associado ao modelo de substituição de importações. Ao utilizar ambos os modelos, a Coreia adota um modelo híbrido. Eles começaram com a substituição de importações visando desenvolver a indústria de bens de consumo não duráveis e outros setores de produção, depois implementaram as políticas para incentivar a exportação.


Essa estratégia beneficiou setores manufatureiros e primários, por terem focado nos dois modelos e não apenas na substituição de importações como outros países. Westphal e Kim destacam a liberalização econômica que ocorre a partir do início do governo Park, em meados de 1960. Essa liberalização incluía reformas cambiais, relaxamento dos controles de importação, desvalorização da taxa de câmbio, políticas preferenciais para exportações, crédito preferencial e subsídios. Os autores ressaltam que as políticas de incentivos à industrialização orientada para exportações são compatíveis com princípios liberais, pois não distorcem os preços relativos do mercado, permitindo as vantagens comparativas e que a Coreia apresentava um nível de proteção e incentivos menor, evidenciando uma zona livre de comércio e um desenvolvimento econômico equilibrado. E por fim, o Banco Mundial em 1987 afirmou que adotar o livre comércio foi correto para o crescimento da Coreia. Há também estudo que reconhece o papel do Estado no sucesso coreano, mas que foi um papel limitado a fortalecer o mercado, com políticas intervencionistas que resultaram na alta acumulação, alocação eficiente de recursos e crescimento da produtividade.


A segunda linha de pensamento é a corrente heterodoxa endogenista que defende o Estado como principal chave do desenvolvimento econômico da Coreia do Sul. Os principais autores são a Alice Amsden e Ha-Joon Chang. Segundo Amsden, os liberais distorcem a história e a importância da intervenção estatal. Em economias que a industrialização tardia ocorreu, é necessário promover a diversificação industrial, manter a atividade econômica e a relação entre crescimento econômico e produtividade.


Amsden ressalta que o governo, através dos Planos Quinquenais, foi responsável pela transição para novas indústrias. A cooperação entre o Estado e o setor privado, conhecidos como Chaebols, foi fundamental para o sucesso coreano. As políticas de promoção, subsídios e protecionismo ajudaram a criar um ambiente favorável para o crescimento econômico e a alta produtividade. Além disso, mesmo em cenários desfavoráveis como como os choques do petróleo e a crise dos anos 1980, o governo coreano adotou uma política expansionista, que criou um ambiente favorável para a expansão econômica e o crescimento das exportações de manufaturas, especialmente na indústria pesada.

Já o economista Ha-Joon Chang critica a visão neoclássica de que a Coreia seguia o livre comércio, pois havia um controle rígido em cima das importações com intuito de proteger e promover a indústria nacional, cuja indústria era seletiva, apoiando setores prioritários e grandes Chaebols.


A última linha de pensamento foca no cenário externo favorável ao país que possibilitou o crescimento elevado e transformação estrutural, sendo os principais autores Carlos Medeiros e Yoo Je Cho. Medeiros enfatiza que o fator chave foi a ampliação do superávit comercial, usando os investimentos do Japão e EUA e evitando colapsos econômicos. Cho argumenta que o cenário geopolítico favorável foi crucial para receber financiamento e empréstimos dos EUA, recursos do Japão como reparação e preferenciais, participação estratégica na Guerra do Vietnã e a retomada de relações comerciais com o Japão.


Outro ponto importante do artigo é a análise do cenário externo para entender a evolução da economia. Durante a colonização japonesa, houve transferência de setores industriais para a Coreia, mudando a relação entre o Estado e o setor privado na Coreia e que se traduziu na cooperação entre o governo e os chaebols. Após a segunda guerra mundial, os EUA ocuparam a Coreia do SUl (1945-1948), sendo um aliado estratégico no novo regime pós-guerra, a fim de conter a expansão da influência soviética na região e ter um produtor de bens. A relação com EUA teve um impacto significativo em vários aspectos, como a reforma agrária, um sistema amplo de alfabetização e educação e a qualificação de mão de obra.


Mesmo com o fim da ocupação americana, os EUA continuaram com a ajuda financeira. Em 1960, a ajuda financeira dos EUA diminuiu, mas as relações do Japão e Coreia do Sul retomaram com o Tratado de Normatização, o que foi crucial para o comércio e o avanço tecnológico. Mas, a estratégia da política econômica da Coreia do Sul que incluiu a estrutura de propriedade, organização industrial, centralização do capital e absorção de conhecimento tecnológico tem que ser levado em consideração, juntamente do cenário externo para o desenvolvimento econômico coreano.


O artigo também enfatiza quatro elementos fundamentais da política econômica coreana para o seu processo de desenvolvimento econômico, sendo eles, a estrutura de propriedade do capital, a organização empresarial, a centralização do capital e a absorção e desenvolvimento tecnológico. Nos anos 1960 e 1970, o governo controlou mais o investimento estrangeiro direto (IED), o que proibiu as empresas estrangeiras de competir com as nacionais e possibilitou que as chaebols dominassem setores estratégicos da economia.


Mesmo com a limitação do IED, a liberação desses investimentos foi estratégica, visando desenvolver a infraestrutura para ciência e tecnologia e assim, as chaebols estavam aptas a competir com as empresas estrangeiras. As chaebols serviam como fontes de capital que cresciam e diversificavam a indústria e para manter o lado competitivo das empresas, recompensavam quem mantinha um bom desempenho através de mais crédito, licenças e subsídios e punia os que não cumpriam as metas, suspendendo os benefícios dessas empresas. Essas políticas ficaram conhecida como “picking winners and punishing losers”, e utilizava parâmetros como metas de exportação, desenvolvimento tecnológico, redução de preços e geração de empregos.


Um ponto importante para o financiamento da indústria foi a reestatização do Bank of Korea (BOK), que tinha sido privatizado em 1950. Como os bancos eram do governo, eles detinham o controle do crédito externo e interno, regulando o acesso ao capital estrangeiro e direcionando para os setores que desejassem. Portanto, a aliança entre o governo e chaebols, permitiu que a tecnologia se aprimorasse ao ponto de fazer um modelo de imitação via engenharia reversa para copiar produtos existentes sem violar patentes.


O sucesso do desenvolvimento coreano, de acordo com o o autor, está atribuído as estratégias internas de políticas econômicas entre 1960 e 1980. Caso não houvesse as políticas de estrutura de propriedade, organização industrial, centralização financeira e absorção de tecnologia, só o cenário externo favorável não seria o suficiente. Vale ressaltar também que os chaebols continuaram influentes na economia coreana mesmo depois dos programas de reestruturação industrial em 1980, a fim de reduzir o poder desses conglomerados. Muitos bancos foram adquiridos pelos chaebols, sustentando o mercado financeiro nacional. A Coreia do Sul continuou com seu crescimento econômico em ascensão, o que despertou análises comparativas entre outros países como o Brasil que tiveram uma industrialização tardia. 


Referências:

LIMA, Uallace Moreira. O debate sobre o processo de desenvolvimento econômico da Coreia do Sul: uma linha alternativa de interpretação. Economia e Sociedade, v. 26, n. 3, p. 585-631, 2017.


 
 

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