A Luta por Independência que esconde a falta de Transparência: um dilema dos bancos centrais
- Gabriel Rodrigues de Castro e Souza
- 14 de out. de 2024
- 3 min de leitura
Resenha de Artigo: Humpage, Owen F., 2014. “Independent within—not of—Government: The Emergence of the Federal Reserve as a Modern Central Bank”. Federal Reserve Bank of Cleveland, working paper no. 14-02.

Humpage sustenta que o Federal Reserve (FED) ainda está em uma disputa por "independência" em relação ao governo dos EUA. Porém, ele reconhece que o conceito de independência é abstrato e frágil, pois não seria tão desejável assim até que o interesse dos bancos centrais seja voltado predominantemente para manter a estabilidade de preços. Governos, diferentemente de bancos centrais, possuem múltiplos objetivos que vão além da estabilidade de preço, como a busca pelo Pleno Emprego, aumento da taxa de crescimento do PIB , estímulos do nível de investimentos e barateamento de crédito para setores industriais. São múltiplos os objetivos possíveis que podem se opor e sobrepor a uma política de controle da inflação, e quando elas se sobrepõem, aí sim, os Bancos Centrais demandam a possibilidade de independência.
Antes de tudo, é importante saber que não é por malícia que uma boa parte dos economistas defende a independência dos bancos centrais, pois não é um conceito derivado de más intenções. Um banco central independente de fato possui certas vantagens, em que suas principais são: 1) a redução da incerteza causada pela volatilidade do cenário político nacional e 2) o direito de ser livre de qualquer obrigação creditícia a dívida governamental (pois isso poderia aumentar a dívida interna).
Porém, não é esse o problema que permeia a polêmica a respeito da Independência de Bancos Centrais. A questão é que um Banco Central não pode ser independente do governo, mas sim independente dentro do governo. É evidente que a condução da política monetária não pode sofrer com a volatilidade do cenário político nacional, mas isso não é justificativa para torná-la apática da política. Um exemplo disso, é o cenário dos EUA durante a Segunda Guerra Mundial, no contexto de guerra existia uma prioridade muito maior que a estabilidade monetária, que era o financiamento dos conflitos.
Por seis anos, o Federal Reserve não era independente e não havia nenhuma oposição a isso! Era notável que havia uma necessidade de financiamento do conflito por meio da fixação dos juros dos títulos públicos para ajudar o Tesouro Americano, e por esses seis anos o FED era diretamente subordinado ao Tesouro em decisões monetárias, tanto que a promoção dos títulos de guerra através da propaganda gerou um financiamento considerável para o governo americano.
Este é um caso bem extremo, mas se engana quem acha que o Federal Reserve é completamente independente nos dias atuais. O FED deve declarações públicas por sua decisões que impactam toda a vida e bem-estar dos Estados Unidos, o que envolve justamente a moeda. O FED é subordinado ao Governo Americano, empresas privadas de gestão de risco (como a BlackRock) e principalmente aos interesses da sociedade civil.
O FED não é totalmente um Banco Central independente pois, nesse caso limite, seria independente do povo e não prezaria pelo bem-estar da sociedade, e sim exclusivamente pelos interesses dos membros de comitê de política monetária.
A independência do Federal Reserve muitas vezes é vista como uma oposição às políticas governamentais de destinação de recursos para setores sociais, além de ser uma forma de garantir um mínimo de supervisão e transparência nas operações bancárias. Por esse motivo, se trata de uma independência voltada para interesses e pautas específicas dentro do FED que não garantem os interesses sociais.
A autonomia buscada pelos supervisores do FED, portanto, parece estar relacionada exclusivamente a questões fiscais e administrativas. Por outro lado, o Banco Central tende a evitar envolvimento em áreas de gestão de recursos públicos que não ofereçam retornos financeiros diretos. Da mesma forma, a independência do FED é importante para o sigilo em transações interbancárias. Contudo, até que ponto essa autonomia, que pode ser influenciada por interesses políticos, é realmente válida? A questão ainda não foi completamente respondida.