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A relação entre bancos centrais e colonialismo na África: os casos do BEAC e BCEAO

Em 1945, após a Convenção de Bretton Woods, a França estabeleceu o Franco CFA (Colônias Francesas da África) como moeda oficial de suas colônias africanas, com o objetivo de orientar economicamente e reorganizar a estrutura monetária dos territórios sob o domínio francês, estipulando uma taxa de câmbio fixa em relação ao franco francês.

Logo do BEAC ( Banco Central dos Estados da África Central) e do BCEAO (Banco Central dos Estados da África Ocidental)
Logo do BEAC ( Banco Central dos Estados da África Central) e do BCEAO (Banco Central dos Estados da África Ocidental)

Inicialmente os membros de Estado foram divididos em duas regiões, cada uma com uma moeda específica e um banco central único, sendo essas o BEAC ( Banco Central dos Estados da África Central) que atende a CEMAC (Comunidade Econômica e Monetária da África Central) e o BCEAO (Banco Central dos Estados da África Ocidental), operando no bloco econômico da UEMOA (União Econômica e Monetária da África Ocidental).


Mesmo com a independência das colônias, a conquista de individualidade e moeda própria dos dois BCs, o Tesouro Francês continuou a garantir  a conversão fixa e ao longo dos anos foi estipulado que operariam com a taxa de 50 Francos CFA para 1 Franco Francês e posteriormente 100:1 em relação ao Euro. Isso significa que apesar de terem moedas distintas, todos os países das duas comunidades do continente seriam regidos pela mesma taxa cambial. O que iremos tratar ao longo desse texto são as consequências desse sistema, a sua estrutura e principalmente a sua relevância.


Os Bancos Centrais que regem as comunidades econômicas dessas antigas colônias tinham o papel de emitir suas respectivas moedas, controlar a inflação e estabilidade monetária, regular transações bancárias, definir as políticas monetárias dos países membros e principalmente tinham a garantia do Tesouro Francês sobre a conversão, com o objetivo de evitar colapsos financeiros.


Porém, apesar das semelhanças, não só os países membros das comunidades eram, e ainda são diferentes, incluindo fatores como a moeda, a base econômica e a própria abordagem de regulamentação dos BCs, ainda sim a mesma taxa de conversibilidade foi estabelecida pela Metrópole. Portanto, um acordo foi estabelecido entre as partes e a França, junto aos países membros, deveriam cumprir algumas regras como 1) garantir a conversão entre o euro e cada moeda CFA, com isso o Tesouro Francês trocaria de acordo com a demanda, concordando em oferecer as Zonas dos Bancos Centrais a quantidade de Euros necessária para impulsioná-las à bom fluxo econômico ; 2) A taxa de câmbio fixa, inicialmente de 50 CFA para 1 Franco Francês e depois, quando a França tornou-se um membro da União Europeia, passou a ser de 100:1, resultando em taxas de inflação dos países da Zona do Franco similares às da França, promovendo previsibilidade econômica, porém menor independência monetária; 3) Livre transferibilidade. Na CEMAC as transferências de fundos entre os Estados membros e a França serão irrestritas, já na UEMOA, há liberdade nas relações financeiras entre a França e os membros da união.


Com todas essas diferenças e semelhanças não só entre os BCs e comunidades, mas também entre os países entre si, é necessário analisarmos se ao longo de sua formação as dificuldades e divergências foram eliminadas ou se foram persistentes e marcantes,  destacando a reflexão se uma única autoridade monetária será capaz de atender às necessidades de cada um dos membros e se  a persistência deles na Zona Franca ainda é relevante. 


Apesar de trazer mais estabilidade monetária, a taxa de câmbio fixa resultou na limitação da autonomia econômica para os países membros, impedindo que ajustes específicos sejam feitos para atender as necessidades de cada Estado.

Por exemplo, as economias que dependem mais de exportação de matérias primas, como a Guiné Equatorial, pertencente à CEMAC, são prejudicadas pela taxa cambial fixa, uma vez que a competitividade externa oscila de acordo com as variações cambiais. Se a conversibilidade é a mesma independente da dinamicidade do mercado mundial, o país pode ficar ou não em desvantagem.


No caso de economias mais diversificadas, como o Senegal, pertencente à UEMOA, uma política monetária inflexível pode prejudicar o estímulo ao crescimento econômico. Ou seja, tendo uma economia diversificada ou não, a taxa de câmbio fixa não permite que os países e os BCs façam ajustes de inflação, os tornando mais vulneráveis a choques externos.


O Franco CFA é um reforço da dependência das ex-colônias francesas em relação a sua antiga metrópole e quando foi desvalorizado, com a entrada da França para a UE,  os Bancos Centrais não implementaram grandes mudanças com relação às suas estruturas, funcionando praticamente no mesmo modelo desde o fim da 2° Guerra Mundial.


A previsão era que a depreciação cambial ajudasse os pequenos agricultores, uma vez que tornariam seus produtos mais competitivos no mercado mundial. Porém, apesar desses terem sido beneficiados de alguma forma, o setor de serviços foi extremamente afetado, ou seja, em algumas áreas, contrariando a expectativa inicial, houve aumento da pobreza nos países, principalmente por conta da maior vulnerabilidade às flutuações nos preços dos bens e serviços. Uma das maiores reflexões em relação à política monetária da Zona do Franco é o efeito que ela tem para as camadas das sociedades dos países membros, já que os Bancos Centrais buscam priorizar o controle da inflação.


Ainda que a Zona do Franco permita que os países membros tenham um espaço de estabilidade financeira diante do cenário mundial e comparados a outras economias africanas, as poucas adaptações estruturais com o passar do tempo fizeram com que essa segurança fosse ameaçada


Portanto, a herança (ou manutenção) da colonização europeia sob a África é um reflexo de como países tão diferentes entre si são unificados e tratados de forma generalista, sem com que suas necessidades individuais sejam propriamente atendidas, dificultando que uma política monetária funcione bem para todos, sendo necessário avaliar se a postura dos Bancos Centrais de tomarem medidas menos ativas e preventivas com relação ao futuro ainda vale a pena em troca de uma taxa cambial fixa em relação ao Euro com a mesma visão de 80 anos atrás.


Referências:

FIELDING, David. What can the European Central Bank learn from Africa?. United Nations University Press, 2005.

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