Cadeias Globais de Valor e Financeirização: integração ou subordinação dos países emergentes?
- Luísa da Rocha Canazarro
- 14 de nov. de 2024
- 3 min de leitura
O capitalismo contemporâneo possui dois pilares em alta nas discussões acadêmicas — as Cadeias Globais de Valor (CGV) e o processo de Financeirização. Para entender como essas dinâmicas moldam as relações econômicas entre países desenvolvidos e emergentes, Juan Pablo Painceira (BCB) e Alexis Saludjian (UFRJ) produziram o estudo " Foreign Direct Investment in the context of Global Value Chains and Subordinate Financialisation: the Brazilian experience".

A inserção de países emergentes e subdesenvolvidos no comércio internacional é vista como parte importante do desenvolvimento econômico, colocando a integração econômica internacional como ponto chave das discussões nesses países. Nos últimos anos, as CGV impulsionadas pelas multinacionais têm ocupado uma posição central na criação de uma integração econômica das economias emergentes, e nesse cenário de expansão das CGV os investimentos estrangeiros diretos não só são um motor do desenvolvimento dos países emergentes, como também configuram a forma das cadeias de valor na economia global.
Do ponto de vista das multinacionais, a participação das Cadeias Globais de Valor pode ser positiva na medida em que o desenvolvimento e o crescimento econômico gera ganhos para os trabalhadores e para o meio ambiente. Contudo, o discurso das CGV deixa de lado fatores cruciais para uma sociedade, como a distribuição de riqueza, desigualdade de gênero e danos ambientais. Do ponto de vista geral, as CGV enfatizam o “valor agregado” dos diferentes pontos da cadeia, e nesse foco são excludentes dos salários.
Assim, há um ponto falho das CGV na distribuição do valor agregado entre capitalistas e trabalhadores, gerando distorções. De um modo geral, as multinacionais legitimam a inclusão dos países, principalmente dos emergentes, por meio da endogenização de tecnologias, o que não ocorreu durante as experiências liberalizantes do século XXI. A partir disso, visando um olhar mais crítico para a inserção das economias subdesenvolvidas nas CGV, deve-se ressaltar que elas acarretam uma crescente concentração de poder em nível corporativo, com ganhos apreciáveis para as empresas líderes dos países desenvolvidos.
Nesse cenário, o movimento do capital entre as formas produtiva, comercial e monetária, além da incessante busca pela produção de mais valor, acaba por sustentar o privilégio dos países desenvolvidos, em detrimento do desenvolvimento dos países emergentes. Com isso, as CGV, em vez de gerarem desenvolvimento econômico, acabam por acentuar cada vez mais as desigualdades, o que explica o uso do termo de Cadeias Globais de Desigualdade (CGD) no artigo. A desigualdade se mostra presente na apropriação do valor produzido pelo trabalho e no papel assumido pelo capital.
O processo de financeirização, por sua vez, é uma etapa do desenvolvimento do capitalismo, o momento em que o capital financeiro ascende em detrimento do capital produtivo. Nesse processo, há a expansão do mercado financeiro e o predomínio das finanças sobre as indústrias, promovendo crescimento da desigualdade e a infiltração das finanças nos diferentes campos econômicos e de reprodução social. Ou seja, as famílias passam a acessar o mercado financeiro ou as finanças de modo geral como meio para suprir suas necessidades.
A financeirização retrata uma profunda transformação no sistema financeiro e consequentemente coloca os países emergentes em um lugar de subordinação, e o caso brasileiro não escapa da análise. No Brasil, os fluxos de investimento direto estrangeiro possuem uma natureza especulativa, e esses fluxos de capitais possuem uma conexão com o aumento das operações financeiras das multinacionais através de dívidas e os fluxos de investimento decorrente de paraísos fiscais. O caso brasileiro não é o único e de forma semelhante esse caráter especulativo tem se tornado evidente no cenário global e em países desenvolvidos.
O artigo trata não só da questão especulativa do investimento direto estrangeiro mas também com um olhar para a geração de perda fiscal. Vários autores têm afirmado que, no contexto do capitalismo financeiro, os fluxos internacionais de capital não beneficiaram o investimento produtivo ou o emprego, mas ajudaram as multinacionais a tirarem proveito de estratégias de evasão fiscal e de otimização tributária. Portanto, em um contexto de Cadeias Globais de Valor e ascensão das finanças, os países subdesenvolvidos ficam cada vez mais subordinados aos países desenvolvidos, sofrem com um aumento das desigualdades e também são vítimias da perda da receita fiscal do Estado por meio das manobras fiscais das multinacionais.
Referências:
PAINCEIRA, Juan Pablo; SALUDJIAN, Alexis. Foreign Direct Investment in the context of Global Value Chains and Subordinate Financialisation: the Brazilian experience. XXVIII Encontro Nacional de Economia Política, 2023.