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Discussões sobre a formação do Banco Central do Brasil

Gentil Corazza aborda no artigo O Banco Central do Brasil: evolução histórica e institucional os desafios encontrados para a criação e consolidação do Banco Central do Brasil (Bacen). A história dos bancos centrais é marcada pelas disputas pelo controle do poder monetário, e no caso brasileiro, houve uma forte resistência para a criação do Bacen, resultando em um processo lento e conflituoso. O início  desse processo ocorreu na década de 1920 e sua criação oficial ocorreu em 1964. O Bacen passou por diversas reformas, deparando se com desafios como a influência do Banco do Brasil e do Tesouro Nacional.


Algumas tentativas de criar o Banco Central do Brasil datam da primeira metade do século XX. A primeira, em 1923, no governo de Artur Bernardes, e a segunda em 1931, com a Missão Niemeyer. No ano de 1945, com a criação da Sumoc (Superintendência da Moeda e do Crédito) pelo presidente Dutra, houve uma espécie de terreno preparatório para a organização de um Banco Central. Contudo, a Sumoc enfrentou resistência dos espaços ocupados pelo Banco do Brasil e do Congresso, limitando suas funções.


Embora com um crescimento institucional na década de 50, a Sumoc ainda enfrentava muitos conflitos com o Banco do Brasil, que permanecia no controle de importantes instrumentos financeiros. O sistema monetário era dividido através da Sumoc, Banco do Brasil e Tesouro, que tinha problemas de emissão de papel-moeda e controle monetário. Somente com a criação do Banco Central houve um controle positivo sobre moeda e crédito que começou a se consolidar.


O Banco Central foi criado e instituído pela Lei nº 4.595, 20 anos após a criação da Sumoc, durante o governo de Castelo Branco na ditadura como uma tentativa de centralização da política monetária e  redução da influência do Banco do Brasil.


Entretanto, a relação entre o Banco Central, o Banco do Brasil e o Tesouro permaneceu ambígua, especialmente devido à administração da dívida pública.  A Reforma Monetária de 1964 estabeleceu que o Bacen assume a responsabilidade exclusiva pela emissão de moeda e controle de crédito ao Tesouro, extinguiu-se a Cared e a Camob, e criou o Conselho Monetário Nacional. Apesar disso, o Banco do Brasil manteve canais de influência, como a administração das reservas voluntárias e a conta movimento, o que impôs dificuldades no manejo fiscal e monetário.


O texto de Corazza destaca as complexas relações entre Bacen, Banco do Brasil e Tesouro, evidenciando mecanismos opacos, como a conta movimento, que dificultavam a transparência e eficácia da gestão monetária. A conclusão sugere que, apesar das reformas, a separação completa das funções monetárias e fiscais ainda estava longe de ser alcançada, com desafios que minavam o objetivo de centralizar e organizar o sistema financeiro brasileiro.

 

O processo de reordenamento financeiro foi iniciado em 1985, com o objetivo de aumentar a transparência das contas públicas e melhorar o controle sobre elas. Na gestão de Dornelles, os déficits fiscais refletiam no Orçamento Fiscal (OF), evidenciando problemas que antes estavam ocultos. Em seguida, no período da gestão de Dilson Funaro, foi feito o congelamento da conta movimento do Banco do Brasil, coinfiscando seu papel de autoridade monetária.


Em 1987, a unificação orçamentária criou o Orçamento Geral da União (OGU), englobando o OF, o Orçamento Monetário (OM) e o das Estatais, e redefiniu as funções do Banco Central (Bacen), do Tesouro e do Banco do Brasil. Reformas posteriores, como a criação do Orçamento de Operações de Crédito em 1988, eliminaram a capacidade do Bacen de financiar diretamente o Tesouro, aproximando-o do modelo clássico de m banco central.


Entretanto, o texto destaca o problema da "zeragem automática", mecanismo que, embora proibisse o financiamento direto do Tesouro pelo Bacen, permitia indiretamente o refinanciamento da dívida pública e comprometia o controle da liquidez e da política monetária. Esse mecanismo gerava um círculo vicioso de dependência financeira, em que o Bacen garantia liquidez ao sistema financeiro a custo praticamente nulo, afetando a eficácia da elevação de juros como ferramenta para controle monetário.


A independência do Banco Central do Brasil


A trajetória e os debates sobre a independência do Banco Central do Brasil (Bacen). A ideia de independência relembra às décadas de 1940 e 1960, nos esforços liderados por figuras como Bulhões, Gudin, Dênio Nogueira e Casimiro Ribeiro. Que tinham como principal objetivo separar a autoridade monetária do Tesouro, do Banco do Brasil e de interesses setoriais, como os da indústria, da classe rural e dos banqueiros privados, todos contrários à criação do Bacen.


O Relatório Niemeyer de 1931 e o Projeto Correia e Castro de 1947 já demonstravam o problema da interferência do Banco do Brasil na política monetária. A independência do Bacen foi formalmente estabelecida em 1964, com mandatos fixos para seus dirigentes, mas sofreu alterações, como a revogação desses mandatos, consolidando o poder do Presidente da República sobre a instituição. A separação definitiva do Banco do Brasil só ocorreu com a Constituição de 1988, que originou em elementos de independência ao proibir o financiamento ao Tesouro e exigindo a aprovação dos diretores do Bacen pelo Senado.


Nos anos 1980, o fracasso dos planos de estabilização reativou o debate sobre a independência do Bacen. Autores contrários argumentavam que a independência poderia acarretar na falta de coordenação política fiscal e dificultar a coordenação macroeconômica submetendo o Bacen a interesses privados. Outros, como Serra (1991), defendiam que o Bacen poderia ser independente, mas subordinado às leis que delimitassem claramente suas competências.


Apesar do avanço em direção à independência, debates sobre o papel do Bacen continuam, refletindo nos desafios históricos e estruturais de uma política monetária transparente e eficiente. O debate sobre a independência do Banco Central do Brasil (Bacen), voltado para as questões institucionais e suas inferências na política econômica. Para autores como Franco (1991) e Serra (1991) a independência do Bacen não é conflitante com a coordenação entre as políticas monetária e fiscal, desde que sejam estabelecidas regras claras de convivência entre as autoridades econômicas. Serra propõe a formação de uma Junta de Política Financeira, que formularia as políticas monetária, creditícia e cambial, com o Bacen responsável pela execução.


Braga (1992) sugere uma reorganização do sistema monetário brasileiro tendo como base três instâncias: uma comissão regulatória do Congresso Nacional, uma comissão de coordenação das políticas monetárias e financeiras, e o Bacen com autonomia condicional, fazendo as políticas dentro de parâmetros definidos pelas instâncias superiores. Ele ressalta que a autonomia do Bacen deve ser limitada por diretrizes claras para evitar o uso ilimitado de seus poderes.


Albuquerque (1991) defende que a independência do Bacen pode impor disciplina fiscal ao governo, considerando o histórico inflacionário do Brasil, enquanto Franco argumenta que a questão fiscal deve ser resolvida previamente. Contudo, Braga destaca que é necessário tratar simultaneamente as reformas fiscal e monetária, criando um novo padrão de financiamento e de gestão monetária.


Vale ressaltar os desafios históricos de separar as funções do Bacen, Tesouro e sistema financeiro, dado o uso recorrente da emissão monetária para resolver problemas fiscais. O debate inclui posições contrárias que questionam a legitimidade da independência do Bacen e suas implicações na coordenação macroeconômica. Apesar disso, é consenso que ainda não estamos em um sistema ideal para garantir maior transparência nas relações entre as instituições e os governos.


 Referência da resenha:

Demais referências:

ALBUQUERQUE, Marcos Cintra C. de (1991). Autonomia do Banco Central. Folha de São Paulo, 17.05.91

BRAGA, J. C. de Souza (1993). A financeirização da Riqueza. Economia e Sociedade, Campinas, no 2, Agosto.

BULHÕES, Octávio G. de (1990). Depoimento. Memória do Banco Central. Programa de História Oral do CPDOC/FGV. Banco Central, Brasília. FRANCO, Gustavo (1991). Aspectos da Reforma Financeira. Rio de Janeiro, FGV, Conjuntura Econômica, dezembro.

SERRA, José (1991). A lei do sistema financeiro: uma proposta. Rio de Janeiro, FGV, Conjuntura Econômica, dezembro.

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