Quais são as responsabilidades dos Bancos Centrais diante das mudanças climáticas?
- João Pedro da Silva
- há 7 dias
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Com a intensificação dos piores efeitos do aquecimento global, seria de esperar maior preocupação dos bancos centrais para lidar com tamanho problema. Apesar disso, para as autoridades financeiras, em sua enorme maioria, o clima é de “Business as usual”. Mas qual então seria o papel dos bancos centrais na crise climática?
Tendo em vista essa questão, Luiz Henrique Bispo Santos (UFRGS) e Eliane Cristina Araújo (UEM) escreveram o artigo: “Financial instability and climate change: new challenges for central banks”. Nele, os autores se debruçam sobre a responsabilidade dos bancos centrais ao lidar com a instabilidade financeira que pode vir a ser causada pelas mudanças climáticas.
Segundo o artigo, é muito provável que o aquecimento global já esteja afetando a estabilidade financeira global. Para entender melhor essa situação, eles dividem as formas pelas quais a economia é afetada pelo clima em diferentes tipos de riscos.
Primeiramente, o risco físico, que são os danos que podem ser causados na infraestrutura e em propriedades pelos eventos extremos, como secas prolongadas ou chuvas torrenciais, que podem reduzir a produtividade na agricultura, levando a instabilidade nas cadeias de suprimentos globais, acarretando volatilidade nos preços, além de outros problemas.
Em segundo lugar, o risco de responsabilidade, que se refere aos possíveis custos que empresas de seguro ou aquelas com alta emissão de carbono podem ter que pagar devido a processos legais movidos pelas vítimas.
E por fim, o risco da transição para uma economia com menor emissão de carbono, que tem a tendência de afetar diretamente setores que são as bases de muitos países, como petróleo, construção, transporte, entre outros.
Tendo em vista as diversas formas que as mudanças climáticas podem afetar a economia, é de se esperar que as autoridades financeiras levem isso em consideração para suas políticas.
De acordo com o texto, os bancos centrais entendem que sua principal função é manter a estabilidade monetária e financeira a longo prazo, e para tal fim, seguem alguns princípios, como ser independentes, e adotar um regime de metas de inflação e uma lei monetária.
Entretanto, em resposta aos efeitos da crise financeira de 2008 e da crise de coronavírus de 2020, intensificados pela integração dos mercados globais. Os bancos centrais aparentemente compreenderam que suas medidas monetárias convencionais seriam insuficientes para lidar com o problema.
As recomendações que tinham como objetivo garantir o livre mercado, foram abandonadas por medidas claramente intervencionistas. Por exemplo, diversos bancos centrais em países desenvolvidos adotaram uma política de compra de dívida do governo ou do setor privado visando aumentar a oferta de moeda e estimular a atividade econômica.
Sendo a crise climática ainda mais agressiva e duradoura em seus efeitos comparada com as outras, seria esperado ações ainda mais firmes por parte dos bancos centrais. Porém, a realidade não é essa, na verdade, as instituições financeiras podem estar diretamente envolvidas com a piora das condições ecológicas, pois as suas atuais políticas monetárias têm subestimado os riscos causados pela crise ambiental, ao dar vantagem a atividades que prejudicam esforços de descarbonização.
Levando isso em conta, muitos têm cobrado dos bancos centrais serem mais flexíveis em suas políticas, do mesmo jeito que foram lidando com as crises anteriores. Alguns até vão mais longe ao alertar sobre a necessidade dessas autoridades adotarem uma política de sustentabilidade, junto com outros agentes, para ajudar na transição para um modelo mais sustentável.
A norma, porém, continua sendo de subestimar os efeitos do aquecimento global. Alguns dos motivos levantados seriam a falta de estudos sobre como as mudanças climáticas afetam diretamente a economia, e também que para muitos ainda permanece a ideia de que as piores consequências das alterações climáticas vão afetar apenas as futuras gerações. Há também a ideia de que essas hipóteses seriam apenas desculpas para desviar a atenção do fato de que os bancos centrais favorecem medidas monetárias a curto prazo, o que dificulta enfrentar um problema essencialmente de longo prazo.
Ainda assim, existem alguns bancos centrais com políticas sustentáveis, sejam feitos de maneira autônoma ou auxiliando políticas de seus respectivos governos. Sobre essas táticas atuais, o artigo elabora que, apesar dos avanços, ainda falta uma política global coordenada para a descarbonização da economia, e que essas iniciativas, como títulos para financiar projetos sustentáveis ou a restrição de crédito para atividades de alta emissão de carbono, se baseiam na lógica de que se os riscos ficam claros, o sistema financeiro vai agir em favor do interesse público. Mas isso não tem se tornado realidade, a tendência das instituições é não levar em consideração o meio ambiente como limite para o processo de produção, é analisado como se fosse algo que pudesse ser resolvido facilmente, simplesmente com maior investimento em força de trabalho ou capital.
Portanto, apesar de não serem descartáveis, essas políticas estão longe de serem suficientes. Nesse gráfico, se observa a emissão de carbono per capita durante as últimas décadas, fica óbvio nele a queda de emissões após crises por conta da desaceleração da economia, que também são os momentos nos quais os bancos centrais adotam políticas não convencionais.

Se, para essas crises eles conseguem fazer isso, por que em uma situação mais extrema eles não conseguiriam?
Em conclusão, o artigo busca analisar a instabilidade financeira induzida pelo clima colocando o papel dos bancos centrais em perspectiva. A hipótese lida com o potencial desestabilizador das mudanças climáticas na economia, e ao analisar a responsabilidade das autoridades financeiras, entende que, se manter a estabilidade econômica é a função de um banco central, então o aquecimento global é um desafio que também cabe a essas instituições.
Até o momento, porém, a maior parte tem deixado a questão climática de lado, e os poucos que fazem alguma coisa, se limitam a políticas para melhorar os sinais do mercado, e não uma política global coordenada para a descarbonização.
Referências:
Santos, Luiz Henrique Bispo, and Eliane Cristina Araújo. "Financial instability and climate change: new challenges for central banks." Brazilian Journal of Political Economy 44.4 (2024): e243617.